Claudinho 90 anos, o Cruyff alagoano

Claudinho 90 anos, o Cruyff alagoano
CRB campeão alagoano de 1951 - Claudinho está em destaque (foto: reprodução)

Por Leandro Paulo Bernardo e Saulo Guimarães – texto escrito originalmente em setembro de 2021

Hoje é o aniversário de um craque que desfilou seu talento por várias equipes do futebol nordestino e deixou muitas amizades por onde passou. Nove décadas de vida para a lenda Cláudio Moreira Pacheco ou simplesmente Claudinho, o legítimo irmão do CRB.

Filho de Lafaiete Pacheco, um dos fundadores do Clube de Regatas Brasil, Claudinho nasceu em Maceió no dia 17 de setembro de 1931. Por total herança da bola começou a jogar no Galo da Pajuçara, assim como seus irmãos Bacurau e Vetinho. Claudinho nos aspirantes já mostrava uma versatilidade em campo, atuando com muita elegância tanto como volante, meia, ponta direita, centroavante e ponta esquerda. Vinte anos antes da aparição do craque holandês Johan Cruyff, Claudinho já demonstrava uma polivalência pelos campos do Nordeste.

Durante a década de 50 Claudinho foi matéria em vários jornais do Brasil, com ótimas entrevistas para imprensa, especialmente ao saudoso Lauthenay Perdigão, quando contou detalhes da sua carreira ao Museu dos Esportes (Local especial para amantes e pesquisadores do Futebol, idealizado e dedicado por Seu Lau em toda sua vida).

Em 1949 Claudinho já integrava o time principal do CRB, após se destacar em campeonatos amadores pelo Treze de Maio. Tornou-se titular absoluto e o grande destaque no bi-campeonato alagoano em 1951. Um timaço inesquecível para a velha guarda Regatiana.

CRB campeão alagoano de 1951
CRB Campeão Alagoano 1951 – Em pé: Cacau, Bandeira, Divaldo, Ernani, Miguel Rosas e Cacará. Agachados: Macêdo, Milton Mongôlo, Claudinho, Dário Marsiglia e Eduardo (foto: reprodução)

Zequito Porto era o técnico do CRB e da Seleção Alagoana. Os treinamentos eram realizados às seis horas da manhã, porque a grande maioria dos atletas trabalhavam e não dependiam do Futebol, tanto que Claudinho jogava de graça e ainda era sócio do clube.

A rivalidade entre CRB e CSA já era muito grande, mas havia muita amizade entre os jogadores, especialmente entre os jovens ídolos Claudinho do CRB e Dida do CSA, algo como Roberto Dinamite do Vasco e Zico do Flamengo (obviamente nessa sequência, pois Dida é o maior ídolo de Zico).

Claudinho era tão respeitado no Time Marujo que foi convidado a jogar pelo CSA no histórico amistoso contra o Vélez Sarsfield em 1951. O jogo foi na véspera do Natal e terminou empatado por 1×1, Claudinho recebeu uma gratificação de cinco contos de réis e sondagens para jogar no futebol argentino.

CSA x Vélez Sarsfield 1951
CSA x Vélez Sarsfield 1951 – Claudinho quinto agachado e Dida o penúltimo (foto: Museu dos Esportes)

Nessa época também havia jogos entre seleções estaduais e a base da seleção alagoana era feita pelos jogadores da dupla de Maceió.

Seleção alagoana de 1952
Seleção Alagoana de 1952 (foto: livro Memória Fotográfica do Futebol Alagoano de Lauthenay Perdigão)

Após um jogo dramático contra a seleção sergipana em 1952, o famoso jogo com três prorrogações, Claudinho passou a ser muito cobiçado por várias equipes do Nordeste.

Alagoas x Sergipe 1952
Detalhe para terceira foto, quando Claudinho observa Dida cabeceando (foto: Diário de Pernambuco)

Para o confronto contra a Seleção pernambucana, o Diário de Pernambuco deu um grande destaque para Claudinho, apontando-o como “A principal figura da equipe, um Crack (termo usado na época) na acepção do termo“.

Pernambuco x Alagoas 1952
Foto: reprodução/Diário de Pernambuco

Náutico e Sport tentaram contratar Claudinho. Aquela Seleção da Terra dos Marechais foi assediada por vários clube  do país, alguns meses depois Dida se firmou como craque, campeão e artilheiro do CSA pelo alagoano de 1952. No início de 1954 acertou com o Flamengo.

Claudinho cobiçado por Sport e Náutico 1952
Foto: reprodução/Jornal Pequeno

Claudinho e o goleiro Bandeira acabaram acertando com o interesse dos dirigentes do Esporte Clube Bahia.

Claudinho EC Bahia 1952
Claudinho no Bahia em 1952

Em Salvador, Claudinho assinou um excelente contrato com o Bahia. Iria receber doze contos de réis de luvas, um conto e quinhentos por mês de salário e ainda o pagamento da pensão onde o atleta passou a residir.

Claudinho em Salvador 1952
Claudinho na pensão em Salvador (foto: reprodução)

Foi campeão baiano em 1952, destaque do time e convocado para a Seleção Baiana (junto com seu amigo Bandeira) num amistoso histórico contra o Botafogo quando Claudinho deu muito trabalho ao lateral Nilton Santos e marcou o primeiro gol na vitória da seleção Baiana.

Botafogo x seleção baiana 1952
Foto: reprodução/Jornal do Brasil

Foi justamente por essa grande amizade com o goleiro Bandeira que Claudinho não continuou no Esquadrão.

Claudinho e Bandeira 1952
Claudinho e Bandeira em Salvador (foto: reprodução)

Bandeira estava se destacando muito. Num jogo do estadual contra o Vitória, foi o melhor jogador em campo, e até defendendo um pênalti. Após a conquista do Estadual houve um desentendimento entre Bandeira e um diretor do Bahia, que culminou com a não renovação do seu contrato. Claudinho, em total solidariedade ao amigo, defendeu-o na confusão e optou pela rescisão do seu contrato com o Bahia.

Esporte Clube Bahia 1952
Foto: reprodução

A partir de então o Sport foi em busca novamente de Claudinho. Assim como o Náutico também tentava contratar o craque.

Jornal Pequeno 1952
Foto: reprodução/Jornal Pequeno

Era uma questão de honra para o Leão da Ilha do Retiro contratar o jogador, pois tratava-se de um desejo antigo do clube e como Dida já começava a fazer sucesso no Flamengo, o Sport não queria perder mais um craque de sucesso saído do futebol alagoano. Claudinho ficou alguns dias hospedado na casa de uma tia, enquanto aguardava o acerto com o Leão da Ilha.

Jornal Pequeno 1952
Foto: reprodução/Jornal Pequeno

Nesse período Dida queria levá-lo para o Flamengo, assim como tentava levar o zagueiro Miguel Rosas. Dida já era ídolo e gozava de prestígio com os dirigentes, dessa maneira conseguiu organizar uns treinos para Claudinho na Gávea. O meia enviou um telegrama para a casa de Lafaiete Pacheco.

Claudinho acabou assinando com o Sport um contrato para receber trinta contos de réis de luvas, quatro mil por mês e mais o pagamento do hotel onde passou a morar com outros alagoanos que estavam no clube.

Claudinho Sport 1953
Foto: reprodução/Jornal Pequeno

O pai de Claudinho, ao invés de mandar o telegrama de Dida para a casa de sua irmã no Recife, enviou para a sede do Sport Recife. A direção do clube pernambucano informou sobre o telegrama somente depois que Claudinho assinou com o clube pernambucano. Quem acabou acertando com o Flamengo foi Tomires, o Cangaceiro, zagueiro que havia sido Campeão no CRB com Claudinho e Miguel Rosas. O Flamengo montou seu trio de alagoanos com Tomires, Dida e Zagallo.

Claudinho ficou mais de dois anos no Sport, por lá reencontrou o amigo Carijó, ex-goleiro do CSA, com quem inclusive disputou campeonatos de Vôlei e Basquete pelo Flamengo de Maceió.

Sport Recife década de 1950
Foto: reprodução

 

Sport Recife 1955
Elenco Sport Recife em 1955, antes da chegada do treinador Gentil Cardoso (foto: reprodução)

Jogando estaduais pelo Sport, Claudinho foi vice-campeão em 1954 e campeão em 1955.

Sport Recife campeão 1955
Sport Campeão Pernambucano de 1955. Treinador Gentil Cardoso o primeiro em pé e Claudinho (quinto agachado) ao lado do Troféu (foto: reprodução)

 

Diário Pernambuco 1955
Foto: reprodução/Diário de Pernambuco

Mas o jogador seguiu no futebol de Pernambuco, ele e o argentino Juan Celly foram jogar no América. El Catita Blanca no futuro se tornaria um treinador vitorioso no futebol nordestino.

Claudinho no América de Pernambuco
Claudinho no América (foto: reprodução)

A dupla passou pouco tempo no Alviverde da Estrada do Arraial e posteriormente  foram juntos para o Ferroviário de Fortaleza. Nessa época Claudinho já atuava praticamente como primeiro volante. Pelo Tubarão da Barra disputou 44 jogos e marcou 2 gols (fonte do ótimo Almanaque do Ferrão). Nesse mesmo ano ele havia recusado uma proposta para atuar no futebol português.

Ferroviário AC 1957
Claudinho, segundo em pé, no Ferroviário. Juan Celly penúltimo agachado (foto: reprodução)

No início de 1958 Claudinho acertou com o Ceará. O alvinegro ganhou aquele estadual e Claudinho era uma unanimidade na imprensa do Nordeste como um jogador de elegância. Tanto que no amistoso entre a Seleção Pernambucana e a Seleção Cearense em 1959 Claudinho foi muito elogiado pelo Diário de Pernambuco. Era um amistoso preparatório para o Sul-americano extra de 1959, já que a Seleção Pernambucana havia sido convidada pela CBD (atual CBF) para representar a Seleção Brasileira.

Seleção Pernambuco Ceará 1959
Foto: reprodução/Diário de Pernambuco

 

Seleção Pernambuco Ceará 1959
Foto: reprodução/Diário de Pernambuco

Naquele ano Claudinho reencontrou o Bahia na segunda fase da primeira edição da Taça Brasil. Após dois empates épicos, o Esquadrão venceu a terceira partida em Salvador e embalou para a conquista do título.

Ceará Sporting Club 1959
Claudinho, segundo em pé, no Ceará (foto: reprodução)

No final de 1959 Claudinho rescindiu com o Ceará, como nunca jogou por dinheiro ou fama, e já deseja largar o futebol e voltar para Maceió. Chegou a ser sondado pelo Santa Cruz e inclusive estava treinando com o elenco coral.

Diário de Pernambuco 1959
Foto: reprodução/Diário de Pernambuco

Contudo o Campinense, tal como o Sport havia feito, aproveitou a estadia dele no Recife e o convenceu a jogar pela Raposa da Borborema. O Campinense estava montando uma forte equipe para jogar profissionalmente seu primeiro estadual.

Diário de Pernambuco 1959
Foto: reprodução/Diário de Pernambuco

O Campinense levou de forma invicta o estadual de 1960. Claudinho ficou dois anos na Raposa e foi bicampeão no ano seguinte. O Rubro-Negro de Campina Grande foi hexa-campeão.

No final de 1961 Claudinho, já casado, resolveu retornar para Alagoas e tomar conta de uma propriedade rural na cidade de Capela. Só que o futebol ainda o queria, especialmente porque naquela cidade da zona da mata alagoana havia uma equipe extraordinária que fez história no futebol do Nordeste; o Capelense.

Campeão alagoano de 1959 e vice-campeão em 1960 e 1961, o Capelense almejava ser a melhor equipe do estado e contava com um grande apoio do seu presidente, Dr. Horácio Gomes. Visando a grande experiência de Claudinho, Dr. Horácio enviou um contrato para ele desistir da aposentadoria e ser um técnico-jogador.

Claudinho acertou a proposta do Galo dos Canaviais e foi ao Recife comprar todo material novo para o clube e observar alguns jogadores.

Claudinho Capelense 1962
Foto: Museu dos Esportes

Todavia Claudinho voltou para Capela e inovou o futebol nordestino ao contratar somente jogadores do interior e das usinas de Alagoas e Pernambuco. No elenco do Capelense apenas Aguiar que tinha jogado no CRB e Zé de Gemi da seleção sergipana não eram do interior. A grande maioria era das Usinas de Alagoas e Pernambuco. Zé de Gemi havia sido o goleiro da seleção sergipana no histórico jogo de três prorrogações em 1952.

Capelense 1962
Capelense Campeão Alagoano 1962. Em pé: Tatú, Zé de Gemi, Nadir, Bernadino, Claudinho, Jório. Agachados: Petrobrás, Corino, Geofonso, Amancio e Avu (foto: site do Capelense SC)

Claudinho fez um trabalho inesquecível. Passou a jogar como centroavante, era praticamente um pivô armando jogadas para o inesquecível trio Bernadino, Corino e Geofonso.

O Capelense conquistou o estadual de 1962 e foi convidado para treinar a seleção alagoana, montando a base com seu excelente time. Algo inédito no futebol do Nordeste, foi a primeira Seleção estadual a ter sua base feita por uma única equipe do interior.

A equipe disputou a Taça Brasil de 1963, no Campeonato Alagoano foi quarta colocada por dois anos seguidos e vice-campeã em 1965. O Dr. Horácio diminuiu os investimentos e Claudinho disputou sua última competição em Caruaru no Troféu Gercino Tabosa. O Central saiu vencedor, mas o destaque foi a vitória do Capelense em cima do Santa Cruz.

Diário de Pernambuco 1965
Foto: reprodução/Diário de Pernambuco

Após o longo e elogiável trabalho no Galo dos Canaviais, Claudinho resolveu voltar ao Galo da Pajuçara. Acertou o convite e foi dirigir o time que fazia parte do seu DNA (literalmente). Sua estreia foi em um jogo festivo contra o Náutico.

Diário de Pernambuco 1965
Foto: reprodução/Diário de Pernambuco

Um outro amistoso do CRB naquele ano foi inesquecível para o futebol alagoano. No dia 25 de Julho, o Santos jogou no estádio Severiano Gomes para um público recorde no antigo alçapão da Pajuçara.

Santos em Maceió 1965
Foto: Museu dos Esportes

Um público recorde de oito mil pessoas viu o Santos vencer por seis a zero com dois gols de Pelé, dois de Coutinho, um de Toninho Guerreiro e um de Peixinho. Em outubro de 1970 Pelé jogaria novamente em Maceió. Recém tricampeão do mundo pela seleção brasileira no mundial do México, Edson Arantes do Nascimento foi inaugurar o Rei Pelé com um público de 45.865 espectadores.

Pelé Pajuçara 1965
Pelé no antigo estádio Severiano Gomes (foto: Museu dos Esportes)

O CRB era uma equipe em transição, muitos jogadores da equipe campeã de 1964 haviam saído e outros não estavam rendendo. Claudinho deu oportunidade a muitos garotos da base, inclusive lançou profissionalmente o jovem atacante Silva, que até hoje é o maior artilheiro do Clássico das Multidões entre CRB e CSA, com 38 gols.

Claudinho deixou o clube em 1966. Teve algumas passagens esporádicas no clube até abandonar definitivamente o futebol, já que nunca dependeu financeiramente dele, pois jogava por amor e alegria. Aos 35 anos resolveu trabalhar em outros setores até se aposentar como funcionário público do estado de Alagoas. Atualmente mora em Maceió com sua esposa Neyd e recorda com muito carinho sua belíssima trajetória no futebol brasileiro.

Claudinho

Equipe Contra-Ataque

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